Aquela moça estranha, remexendo nas moedas, observando detalhes, naquela temperatura escaldante que só essa cidade sabe emitir. Dez minutos. Vinte. Nada do seu ônibus aparecer.
Chega uma mulher, senta-se ao seu lado e a encara. Não é a primeira vez, e apesar de causar-lhe constrangimento, ela já se acostumou. Debaixo desse sol de 40 graus é mesmo surpreendente que sua pele ainda não tivesse sido castigadamente queimada. Ela até tenta imaginar como fugir de um câncer de pele nas próximas décadas. Mas o que a entretém mesmo são as moedas. Durante aquela espera prolongada, pelo transporte azulzinho que parece fazer questão de demorar, o que lhe resta é observar banalidades.
O ano é 2012 e ela para e olha atentamente. 1994. Aquela mísera moeda de R$0,10 foi cunhada em 1994. Tinha apenas seis anos e também passava por mudanças. Mudança de escola. E aí sua timidez aflorou, a moça consegue se lembrar. Gente nova, estranha, o projeto de capeta agora se envergonhava. Não tinha coragem de levantar a mão sequer para pedir para beber água ou ir ao banheiro. Gente estranha sempre a apavorou, e ficar cercada assim só piorou tudo. A criança danada, que pulava janelas, tomava as tarefas dos colegas para ela própria terminá-las agora se via por demais retraída. Dezoito anos depois ela ainda tem que lidar com isso.
Ela não sabia ao certo o que queria ser na vida. Naquela cerimônia de encerramento do Ensino Infantil todas as crianças ao redor sabiam que profissão desejavam. Mas ela cuspiu a primeira coisa que lhe veio à mente. Não imaginava que quase duas décadas depois ainda sentiria essa indecisão. Que faria algo que gosta, mas que teria tantas outras mais que fariam seus olhos brilharem. Não imaginava que gordinha ainda seria por boa parte da sua vida. Que teria um câncer aos 19. Que, aos 22, faria uma redução de estômago - como uma criança imaginaria isso? - para só então ter um aspecto mais saudável e agradável aos seus próprios olhos. Que passaria por tantos amores, desamores, aventuras e desventuras, ao longo das décadas. Que se preocuparia tanto com prazos, horário de sono, com emprego ou plano de saúde. Que viveria um amor tão forte que a faz levar mais fácil todas as preocupações supracitadas. Não, não imaginava nada disso. Nem poderia. Estava com a cabeça onde deveria estar: aprender a ler, escrever, fazer umas contas bobas de matemática e brincar. Além de contornar o mandonismo da irmã mais velha que insistia em colocar-lhe de castigo como se sua mãe fosse.
E é no improviso, dançando e fazendo piruetas na corda bamba pra lidar com as piadas - inclusive o esporádico humor negro - da vida que ela vai a caminho da terceira década.
Que seja feliz rumo ao 25º ano. É o único desejo certo que ela tem.
Mayara S.
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